ATO I - A tempestade
EM UMA CIDADE ENSOLARADA À beira-mar, de plácidas orlas e belos montes, de serras frondosas e cristalinas fontes, que muito depois seria conhecida pelo mundo todo como a do Janeiro maravilhoso e das Américas o encanto, vivia um jovem chamado Jonas. Menino bonito, sincero e inteligente, passa o dia ocupado, em tarefas domésticas ou ajudando o pai no pequeno armazém de pescados da família.
Entre o porto e o antigo forte de São Thiago no Morro do Castelo, onde mora em um modesto casebre, Jonas aproveita as horas vagas para timonear seu pequeno barquinho pela grande baía, da qual conhece bem as correntes e onde devora horas descortinando novas praias e reentrâncias. Vez ou outra, como que arriscando suas habilidades, ousa singrar para além do grande maciço granítico que guarda a entrada da baía, sonhando ver um navio desconhecido ou um grande monstro marinho, como nas histórias que os pescadores contam lá no armazém de seu pai. Suas aventuras náuticas, porém, sempre terminam com o seu estômago roncando de fome ou a garganta ressecada reclamando de sede, obrigando-o a voltar com o seu barquinho e postergando as aventuras.
É uma manhã úmida de setembro. Os brotos já estão virando flores e o orvalho solta um aroma agradável, mistura de água com mato que invade as ruas e lembra os homens de mais um equinócio, do abrir de mais uma primavera.
Jonas acaba de sair da missa na Igreja de Santo Inácio e desce com pressa a rua Santa Luzia em direção à praia. Quer aproveitar o vento favorável da manhã e partir para mais uma aventura em alto-mar. Desta vez, vai precavido, pois pretende ir mais longe e atracar em alguma ilha deserta, onde possa procurar por tesouros perdidos de algum pirata francês ou corsário inglês, quem sabe, até descobrir os restos encalhados de algum antigo galeão português.
- Goiabas, bananas, uma ninhada já preparada com peso e o anzol, um saco com iscas, cantil cheio, um pacote com biscoitos e um pouco de pão. - Jonas vai carregando o pequeno barco com mantimentos, preparando-se para partir. - Meu capote também, caso o tempo vire.
Como fosse algum tipo de premonição ruim, Jonas apanha o capote e sente um arrepio de frio subir pela espinha. Faz o sinal da cruz e, confiante, empurra o seu pequeno barco para a baía. Dali a pouco, já estava passando rente à arrebentação das pedras sob as bocas de ferro da Fortaleza de Santa Cruz e rumando para o mar aberto como se fosse o próprio Aquidabã, majestoso, com seus oito canhões desafiando a ditadura militar daqueles generalecos bagunceiros.
“Bummm!” Imitando com a boca os disparos de tiros de canhão do velho casaca de ferro em direção à cidade. - Bummm! Tomem mais essa! Agora vamos, tripulação, atravessar o oceano e resgatar a imperatriz Redentora na Normandia! Avante! - Brincava Jonas, enquanto avançava entre as largas marolas do mar aberto, sem perceber que as pesadas nuvens de tempestade aproximavam-se de oeste.
Apesar de não ter muita experiência em mar aberto, sente-se cada vez mais confiante e ignora o vento que bate cada vez mais forte. Não demora muito para que o pequeno barco comece a chacoalhar sem controle entre as ondas, inutilizando qualquer esforço de Jonas em tentar regressar em segurança para a baía. A terrível ventania só piora e Jonas larga os cabos, encolhe-se junto ao piso da proa, segura firme com as mãos espalmadas nos dois lados da embarcação e reza a Deus para que poupe a sua vida.
- Pai Nosso que estais nos céus,
santificado seja o Vosso nome,
venha a nós o Vosso reino,
seja feita a Vossa vontade
assim no mar como no céu.
Jonas reza sem parar... usando as palavras como seu único escudo contra aquele mar enfurecido.
- Pai Nosso que estais nos céus,
santificado seja o Vosso nome,
venha a nós o Vosso reino,
seja feita a Vossa vontade
assim no mar como no céu.
Lembra-se das palavras do padre na Igreja de Santo Inácio naquela manhã: “Não rezem muito rápido, meninos, senão Deus não vai entender o que vocês estão querendo dizer” e, tentando se acalmar, ora mais devagar:
- Pai nosso… que estais… nos céus… santificado seja… o Vosso nome… Vem uma onda bem maior do que as outras e desaba sobre o pequeno barco, quebrando o mastro e quase joga Jonas ao mar. Jonas volta a se desesperar e termina aquela oração ainda mais rápido que as anteriores, - Traz logo o reino, a Sua vontade, e me ajuda!!! - Grita Jonas cheio de angústia, enquanto o seu barquinho some em meio às altas ondas e à tempestade assustadora.
O dia se confunde com a noite. Uma espessa neblina engole a pequena nave de Jonas, envolvendo-a em um turbilhão de incontáveis ondas, incessantes por toda madrugada. Na manhã seguinte, o vento da tempestade se esvai e o barco bamboleia por entre a névoa, com o mastro quebrado e as velas completamente rasgadas.
- Água… água… - balbucia Jonas, esticando a língua para aproveitar as gotas que escorrem dos velas esfarrapadas e molhar a boca seca. A neblina se desfaz e Jonas percebe o tênue contorno de uma ilha, - Terra… terra! Uma ilha! - Grita, feliz por encontrar terra firme. Abaixa-se e começa a remar com os braços, apoiando a barriga na lateral do casco de madeira. As ondas carregam o pequeno barco para a praia de areias brancas e muitas palmeiras. Parece muito com a sua terra mas não reconhece nela nada de familiar. Logo que pisa na praia arenosa percebe a presença de árvores frutíferas e, apesar de extremamente cansado, põe-se a devorar o que vê pela frente.
JONAS
- Pitanga… -, colhe e morde de uma bocada só, - ...banana... - pega e come, quase sem descascar, - ...goiaba! - Larga tudo para comer a goiaba. Feliz por estar vivo, mas também bastante preocupado, percebe que não está sozinho naquela ilha. - Peraí… alguém plantou essas árvores aqui de propósito, não é uma ilha deserta. Que tipo de gente será que vive aqui? Será que são pessoas boas ou não? Bem, onde quer que eu esteja, isto não é nada entediante!
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